sábado, 9 de maio de 2009

Montesquieu e Leal dizem o mesmo, com razão

Texto de Saul Tourinho Leal, que pode ser acessado pela internet, trata da maior visibilidade do Supremo Tribunal Federal, e de como ela levou à transformação de ministros em pop stars e figuras non gratas.
Há nele, no entanto, um trecho que quero destacar, pois está no cerne de muitos das mazelas nacionais. Diz o jurista:
"O Brasil, de pouca originalidade na criação dos próprios institutos jurídicos, é pródigo em importá-los, descaracterizando-os.
Os Estados Unidos tributam basicamente a renda. A Europa, o consumo. O Brasil tributa os dois. A Alemanha criou a cláusula de barreira que impedia a posse do candidato filiado a partido que não ultrapassasse-a. No Brasil, o instituto permitia a posse e todas as vantagens dela decorrentes, mas impedia o parlamentar de trabalhar. As affirmative actions, logo no Brasil, teve como critério a cor da pele. Nos Estados Unidos, quanto aos tipos de controle de constitucionalidade, vigora o controle difuso. Na Europa Continental, o concentrado. No Brasil, os dois. No caso da adoção da doutrina da "sociedade aberta dos intérpretes da Constituição", mais adiante tratada, seus defensores são adeptos da visão procedimentalista, que reduz a discricionariedade do Poder Judiciário no exercício da jurisdição constitucional. No Brasil, uma Corte substancialista o adota. Criatividade com institutos alheios, como se vê, não falta."
Montesquieu escreveu:
" A lei, em geral, é a razão humana, uma vez que governa todos os povos da terra; e as leis políticas e civis de cada nação não devem ser senão casos particulares em que se aplica essa razão humana. Elas devem ser tão adequadas ao povo para o qual são feitas que será um grande acaso se as leis de uma nação forem convenientes a uma outra. É preciso que elas se relacionem com a natureza e com o princípio de governo que é estabelecido ou que se quer estabelecer, quer elas o formem, como fazem as leis políticas, quer elas o mantenham, como fazem as leis civis. Devem se relacionar com o físico do país; com o clima gelado, tórrido ou temperado; com as qualidades do solo, com sua situação, sua extensão; com o gênero de vida dos povos, lavradores, caçadores ou pastores; devem se relacionar com o grau de liberdade que a constituição pode suportar; com a religião dos habitantes, com suas inclinações, com suas riquezas, com sua quantidade, com o seu comércio, com os seus costumes, com suas maneiras. Enfim, elas têm relações entre si, têm relações com sua origem, com o objeto do legislador, com a ordem das coisas sobre as quais são estabelecidas."
Na verdade, desde sempre, há um descasamento entre o desejo das elites, transplantar a civilização européia para os trópicos, em especial a francesa, e os costumes do brasileiro comum, mais identificado com o centralismo ibérico que via no seu dia-a-dia. Cada mudança que tentam introduzir na legislação amplia o fosso.
A Constituição Federal foi escrita no espírito do parlamentarismo, mas, sempre que chamada a opinar, a população reitera sua vontade de ser comandada por um presidente forte. Se queremos viver em uma democracia, não há de se combater a vontade do povo.
Não somos um país europeu, feliz ou infelizmente, temos que conviver com isso. Cabe-nos tentar fazer o melhor com o Brasil que possuímos, não importar soluções muito bonitas em outros cantos; ficariam deslocadas nestas paragens.

Um comentário:

felipe Bauru disse...

Muito bom este artigo.
Concordo totalmente.
Mas com deputados e juristas que não dão a minima para a opinião pública continuaremos com as distorções e maluqices de hoje.
O pior é que me parece que o povo gosta exatamente do que acontece hj, assistencialismo e roubalheira. É tão triste que chega a ser comédia.