É só observar as muitas discussões neste espaço democrático e vemos que o povo brasileiro não gosta realmente do debate e da troca de idéias. O que vemos aqui é uma infinidade de imposições e muitas trocas de ofensas pessoais quando se abre um tema mais polêmico, como este aqui da liberação das drogas.
O fato de que alguém seja favorável ao aumento das liberdades individuais não significa que seja apologista do uso destas liberdades. Em um debate anterior – sobre a regulamentação da prostituição – houve quem sugerisse aos debatedores que fossem às esquinas rodar bolsinhas ou levassem seus familiares para isso. Portanto, querer dar dignidade à profissão exercida por milhares de mulheres e homens do Brasil era o mesmo que dizer que achava que aquela era a melhor maneira de ganhar dinheiro para uns debatedores ensandecidos.
O mesmo está acontecendo neste debate. Não sou usuário e muito menos traficante de nenhuma das variedades de drogas ilegais (mas não dispenso uma caipirinha em determinadas ocasiões) e nem apoio o uso destas por ninguém, mas sou obrigado a aceitar que estas existem, quer eu queira ou não; sendo assim, prefiro que façam parte do mercado legal e livre do que sejam utilizadas como uma máquina de fazer dinheiro para malfeitores e corruptos.
Dito isso, sou obrigado a refutar alguns argumentos que foram utilizados aqui para dar como certo a impossibilidade da aceitação da legalização das drogas no País.
Um argumento muito usado pelos debatedores é o de que a droga ilegal destrói a família e, conseqüente, a sociedade.
Com isso, depreende-se que as drogas penetram em famílias sadias e nas quais não há nenhum conflito e são a única força que leva a falta de coesão. Isso é um conto da carochinha, na maioria das vezes a droga - legal ou ilegal - é uma válvula de escape encontrada no seio de uma família já desestruturada; caso seja privada desta, outra será encontrada e poderá ser até mais deletéria que a primeira.
Drogas muito pesadas e perigosas são utilizadas legalmente sem desestruturar famílias, como o álcool. Em alguns casos há a desestruturação, mas culpar a droga é trafegar pelo caminho mais fácil de se tentar retirar a culpa dos homens onde só ela está.
Outro argumento que está sendo muito utilizado é que o Estado não teria capacidade de controlar o comércio de drogas caso ele fosse legalizado.
Mas oras, ele o controla enquanto ilegal? É claro que não.
É mais provável que o mercado negro de drogas pudesse até continuar ocorrendo, como há o de cachaças de alambique sem nenhum controle estatal, porém se tornaria legal a abertura de empresas legalizadas e passíveis de controle e fiscalização.
Pior do que está não ficaria.
Também estão escrevendo que haveria uma explosão do consumo pela facilidade de obtenção.
Outro medo que só se justificaria caso fosse difícil obter drogas hoje, o que está longe de ser verdade.
Qualquer moleque de 12 anos que esteja querendo experimentar compra o entorpecente sem muito esforço e estará sujeito ao contato com meliantes perigosos que a comercialização legal evitaria.
Quanto ao aumento do uso do serviço público de saúde para o tratamento de drogados, drogaditos, viciados ou como queiram chamar.
Pressupõe-se então que estes não são atendidos pelo sistema publico hoje?
Já o são e tem-se uma carga adicional da violência das gangues traficantes, que responde por uma boa parcela do atendimento nos serviços de urgência e tratamento intensivo (os mais caros de qualquer hospital).
Dizer que o tratamento de recuperação para os usuários esgotaria os recursos públicos é uma simplificação e, mesmo que acontecesse isso, seria preciso colocar na balança do custo benefício as vidas poupadas nas guerras de gangues.
O fato é que para todo e qualquer argumento contrário a legalização há um oposto que a favoreceria, e que na minha opinião é mais forte. Só que nenhum é suficientemente poderoso para vencer a predisposição das pessoas a favor ou contra as drogas, pois aqui se encontra algo de foro íntimo.
Mas querer impor uma questão moral ao conjunto da sociedade é a mais clara expressão do autoritarismo. Se alguém quer se envenenar usando drogas, creio que é dever da sociedade permitir.
Deve apenas o indivíduo ser alertado de que aquilo é um veneno e que traz conseqüências que terão que ser enfrentadas pelo indivíduo.
Não pela sociedade, como é hoje.
Obs: Ao contrário do que acontece normalmente, este texto foi publicado primeiro no Jornal de Debates; caso não o conheçam, de uma passada por lá.
O link para os meus textos naquele site está na coluna ao lado.
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