domingo, 1 de fevereiro de 2009

Aguapé: a mão na roda

Voltando ao velho Anuário Agrícola. Quando do lançamento da publicação, o que mais me impressionou ao ler sobre as diversas culturas brasileiras foram as diversas qualidades do aguapé. Segundo ela, essa planta era a de maior capacidade de fotossíntese entre as conhecidas. Tem, ou tinha - não sei se encontraram outra ainda mais eficiente -, portanto, a maior capacidade de usar energia solar para produzir matéria orgânica, através da fixação do gás carbônico.
Nem imaginava-se a possibilidade do etanol celulósico, porém a cultura já era vista como promissora em agroenergia. Cálculos da companhia energética Cesp, à época, diziam que 10% das represas de Americana, Billings, Barra Bonita e Bariri, caso utilizadas para cultivo de aguapés, forneceriam colheitas diárias de 14211 toneladas da planta, que poderiam produzir energia equivalente a 293000 litros de petróleo (aproximadamente 1800 barris), em uma proporção de 32 metros cúbicos por tonelada, com 65% de metano em sua composição. Pouquíssimo para uma área tão grande, poderia qualquer um dizer, mas vindo de uma área impossibilitada de uso por contaminação por material orgânico, onde os aguapés florescem, parece um presente dos deuses.
Notem que aqueles eram tempos pré-ecochatimos e Rio-92, nos quais as intenções das pesquisas eram apenas prover o Brasil com recursos naturais então escassos, água limpa e combustíveis, mas hoje já se imaginam muitos outros usos para a planta, como este e este, com ênfase nas reduções de custo do tratamento de efluentes, um dos programas sanitários em que o Brasil está mais atrasado.
Resta, contudo, ainda a alternativa da exploração energética. Demanda pelo gás há. O Brasil importa da Bolívia 24 milhões de metros cúbicos diários, ou, caso mantidos os mesmos parâmetros de eficiência de 20 anos atrás, mais de 16 milhões de toneladas de aguapé. Número aparentemente impossível de ser alcançado, pois representa o uso de algo como 28 milhões de hectares para a cultura, considerada a produtividade de 200 toneladas por hectare por ano, algo como 4 vezes a área utilizada pela cana. O que equivale a dizer que, caso fosse incentivada, a produção teria mercado cativo.
Os serviços ambientais potenciais são, porém, a melhor atração atual da planta. Retirando o carbono atmosférico eficientemente, filtrando a matéria orgânica dos cursos d´água e sendo utilizada como adubo orgânico e cobertura vegetal de solos utilizados para outras culturas, ela pode servir para diminuir a insustentabilidade da relação rural-urbana, que apenas retira nutrientes do primeiro e não os devolve, fazendo da suplementação de adubação química imprescindível. Consorciado com a piscicultura, suprir parte da proteína consumida pela humanidade. A energia é, neste contexto, um bônus.
Nossas fauna e flora nativas oferecem-nos potencial imenso para que lidemos com os problemas, atuais e futuros. Cabe-nos saber aproveitar as oportunidades e criar as tecnologias necessárias. Esperar que outros façam isso por nós apenas fará a dependência externa agudizar-se. É o que queremos?

Nenhum comentário: