Hoje estreou mundialmente “Cruzada”, filme de Ridley Scott (“Kingdom of Heaven”, 2005). Não vi, mas uma coisa me intriga.
Pelo que tenho lido na imprensa, apesar de tratar de um embate entre as forças católicas e muçulmanas pelo controle de Jerusalém, o filme não trata de uma cruzada. Muito pelo contrário, seria no máximo uma anti-cruzada, pois os atacantes aí são as forças islâmicas comandadas por Saladino – que por coincidência nasceu na mesma Tikrit de Saddam Hussein. Até onde sei não foi motivada por motivos religiosos também, como era o caso das Cruzadas.
É verdade que o nome em inglês não faz menção ao termo, sendo que algum tradutor deve ter pensado que Reino do Céu não iria levar muitas pessoas para as salas de cinema. Porém o uso da palavra céu para descrever uma cidadezinha perdida no Oriente Médio já se faz pensar nas conotações religiosas envolvidas no filme.
No momento que se vive um embate entre parcelas fundamentalistas das duas religiões com mais adeptos no mundo, isto é ao mesmo tempo um chamariz fácil para vender ingressos e pode tornar-se mais uma fonte de atritos entre os “guerreiros” de fé. Como sabemos, quanto alguém quer brigar, uma olhada de lado é motivo suficiente.
Mesmo porque em um filme de duas horas e vinte e cinco minutos não se conseguirá mostrar as duas versões da história e, sendo um filme de guerra, alguém vai ser mostrado como o vilão. Sendo Orlando Bloom um reconhecido “mocinho” hollywoodiano, provavelmente o lado errado vai ser o vencedor; o muçulmano ou “de lá”.
Ridley Scott é um diretor já consagrado com sucessos como “Thelma e Louise”, “Blade runner” e “Gladiador” e não precisaria de um sucesso fácil movido pelo preconceito e sensacionalismo barato, mas se formos pensar logicamente, a guerra que exacerbou este conflito fundamentalista não teria acontecido também.
E $130 milhões (de dólares) podem fazer qualquer estúdio partir para a baixaria na tentativa de recuperá-los. Aproveitar as manchetes de uma guerra que está acontecendo neste momento com muçulmanos radicais tentando expulsar combatentes estrangeiros não seria a maior já cometida.
Ao apelar para um nome que expõe abertamente o conflito religioso da trama os tradutores brasileiros não dever ter sido francamente contra os estrategistas mundiais dos estúdios Fox. Ainda mais quando estão faltando com a precisão dos fatos históricos.
Quando estreou a 5 anos atrás, “Gladiador” trouxe de volta aos cinemas os épicos históricos que já haviam feito fortunas e construído carreiras dos estúdios americanos nos anos 50 e 60, como “Ben-hur”, que já renderam frutos com “Alexandre” e “Tróia” e neste “Cruzada”. “Paixão de Cristo” ressuscitou o cinema bíblico, que talvez teve seu melhor momento em “Os dez mandamentos”. Só espero que “Cruzada” não inicie uma onda anti-islâmica em uma indústria que é dada a modismos e simplificações.
Maniqueísmo é tudo que menos se precisa no mundo atual, já cheio de radicais para todas as matérias possíveis e imagináveis. As artes, que são a área onde isto menos vigora, não precisam de uma onda disso.
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